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"Minha Amada,
Ouve, é a minha alma que te escreve. Este papel esconde a minha vergonha, mas também será ele que, finalmente, me revelará perante ti. (...) Sempre tivera medo que desestabilizassem a minha tristeza, acreditava que nela estavam a minha paz e a minha segurança, por isso me conformei, contente, com o que a vida me entregou. (...)
Devo confessar-to. Continuo a ter medo. Mas este é um medo diferente. Fizeste-me ter consciência dos meus vazios; contigo, iniciei uma procura interior que não pára de ferver dentro de mim e para a qual não estou sequer certo de encontrar uma solução. Mas comecei a andar. Garanto-te que a minha alma é melhor do que eu, porque a pressinto limpa e nova para ti. Espero que não seja demasiado tarde. Nas minhas tantas noites de insónia, o céu ensinou-me que há um momento em que o muito tarde se pode tornar, para nós, em muito cedo. É apenas um instante que se apaga e acende numa suave centelha; quando a noite agoniza nos braços do primeiro raio de luz nascente. Espero que este seja esse momento.
Minha amada Estrella. Sou casado. Há dezoito anos decidi partilhar a minha vida com uma mulher maravilhosa que julguei amar com loucura. Os nossos dias foram-se congelando entre as neves do silêncio e hoje, com dor, verifiquei que sobrevivi ao frio da nossa relação aquecendo-me nos restos de gestos que restavam dos nossos primeiros anos. Contraí com ela um compromisso de amor eterno que hoje me deixa imobilizado em relação a ti porque, sabes?, nestes dias de reflexão profunda, dei-me conta de que quanto mais fiéis somos a nós próprios, mais infiéis podemos acabar por ser aos outros. (...)
Fui educado na fria contenção, na responsabilidade e no bom comportamento, embora à custa de sacrificar os meus sentimentos mais sensíveis, porque tens que saber, amada Estrella, que a sensibilidade não é uma qualidade que pertence apenas às mulheres. Hoje, confesso-te, não me envergonha verificar que sou um ser sensível. Durante toda a minha vida, os meus sentimentos mais íntimos estiveram a procurar vias de escape para esconder ou libertar as minhas dores e prantos. Graças a ti, nestes dias recuperei, ainda às escondidas, as minhas lágrimas.
Fui educado na fria contenção, na responsabilidade e no bom comportamento, embora à custa de sacrificar os meus sentimentos mais sensíveis, porque tens que saber, amada Estrella, que a sensibilidade não é uma qualidade que pertence apenas às mulheres. Hoje, confesso-te, não me envergonha verificar que sou um ser sensível. Durante toda a minha vida, os meus sentimentos mais íntimos estiveram a procurar vias de escape para esconder ou libertar as minhas dores e prantos. Graças a ti, nestes dias recuperei, ainda às escondidas, as minhas lágrimas.
Tive um pai que não descansou enquanto não julgou ter castrado a totalidade dos meus sentires, transformando-me num homem de bem - um verdadeiro orgulho para a sua masculinidade - fazendo-me um infeliz. Não o culpo; à sua maneira, pensava que me estava a dar o melhor que tinha. No fundo, somos todos o produto das educações recebidas pelos nossos antepassados, e a mim coube-me como herança a contenção do meu sentir. Durante anos, vivi seco; sedento de vida e seiva que, compreendo agora, só podem sorver-se sentindo a vida com plenitude, lutando por satisfazer os desejos. Isto, que parece simples, ignorava-o até que te conheci.(...)
Deste-me asas e alegria; vontade de rir e chorar. Provocaste um renascimento que fez florir os meus dias vazios. Agora, quero aprender tantas coisas, só para tas ensinar... analiso os pores do sol e as fases lunares. Recolho as folhas caídas das árvores e observo a perfeição da sua estrutura. Descubro o voo das gaivotas e o canto dos estorninhos. Volto a contemplar o mar com olhos novos.
Tudo me parece fácil. Qualquer coisa que faça, por mais banal que seja, dá-me prazer. Entrei num estado de consciência surpreendente. (...) Se tivesse de me definir numa palavra, diria: efervescente. Sim, é assim que me sinto desde que te conheci. Ajudaste a simplificar a minha alma. Tudo o que me deste fez o meu coração transbordar de prazer. Fizeste-me sentir uma fadiga de amor desconhecida. Devo parecer-te um homem estranho, dado que não procurei em ti o teu corpo, embora tenhas sentido bem a loucura que a tua presença provoca na minha pele. Existe tanta sensualidade em cada poro do teu ser, que me acorrentei ao teu corpo sem ainda me ter esvaziado nele.
(...) O meu coração e a minha razão não se pôem de acordo. (...) quando regresso ao quotidiano e à rotina dos meus dias, levantam-se como muros todos os meus impedimentos. Olho para a minha mulher e sei que ela não teve culpa das minhas frustrações, mas assim como contigo me sinto fluído, com ela ainda não posso abordar as minhas verdades. Sei que um dia esses muros acabarão por desmoronar. Só te peço tempo e fé, poderás dar-mos?
Minha amada criança. Nestes longos dias de espesso silêncio, os teus olhos guiaram-me com a sua luz, iluminando as minhas trevas. A tua sombra, colada ao meu corpo, acompanhou os meus suores. Não deixei de estar em ti um único instante. Penso que do mais dissonante silêncio pode brotar a música mais bela. Sinto que esta separação me fez tomar plena consciência do que pode ser querer ou amar. No querer há ânsias e desejos. No amar, apenas o desejo do bem à pessoa amada.
Agora já sei que, se não te tivesse, continuaria a amar-te. Porque o amor não pode ser posse. Verifiquei-o ao ter-te sem te ter. Acima de tudo, quero que saibas que te amo, assim, sem mais nada. Mas, como simples mortal, também quero que saibas que te desejo com toda a minha alma. Tiraste-me o medo de viver. Não sei o que nos espera, mas sinto que contigo vou começar de novo uma caminhada mais plena e intensa. Agora já sei que tenho uma alma. Tu revelaste-a perante os meus olhos; reconhecendo a tua, descobri a minha.(...)
Vem, aproxima-te mais para te tocar a alma. (...)
Vem, aproxima-te mais para te tocar a alma. (...)
Ângela Becerra in Amores Negados
[2011/12/27]
28 de dezembro de 2011 às 12:45 �
Ah, se a nossa memória física soubesse um ínfimo do que sabe a nossa alma... Sería, a terra, um lugar tão mais cheio de felicidade!
Beijinhos minha linda amiga
29 de dezembro de 2011 às 00:11 �
Ivete, bom ver-te
Tens toda, mas toda a razão :)
Beijo grande e que 2012 te seja um ano FELIZ ;)