19:19
"Aqui estou eu
Sou uma folha de papel vazia..."
Perfeito vazio - Xutos e pontapés
Continuo aqui, enfrentando esta folha de papel em branco, apurando os meus sentidos para lhe sentir o toque macio e o cheiro quente. A caneta parece não me ser de serventia, parada na minha mão, e o meu pulso parece não se querer mexer, naquele movimento frenético do costume, quando inspirada, desenrolo as palavras e as derramo no papel. Gosto de desenhar cada letra na minha peculiar caligrafia, observando a forma mágica como as palavras se vão formando originando, tantas vezes, sentimentos avessos e até desconhecidos. Gosto do cheiro da tinta permanente, afirmativa, cheia de personalidade, que marcará de forma indelével aquela folha de papel que já foi em branco e agora já não o é mais.
Assim somos nós, como uma folha em branco a cada novo capítulo. Não vale a pena sequer tentarmos arrancar as folhas que albergam as passagens que menos nos agradam, do livro da nossa vida. Todos esses parágrafos terminam num ponto final, no pressuposto, mais que justo, de que todo o fim implica um novo começo. E em cada novo começo, uma nova página em branco.
Neste livro que faz prova provada da nossa passagem pela Vida, muitas vezes não somos nós quem escreve, mas tantas vezes somos só nós quem lê… Somos também como que um livro de visitas, que tanta gente que passa vai assinando, ou como um livro de autógrafos, onde recebemos as palavras que outros nos querem oferecer e dessa forma nos vamos fazendo gente, nos vamos deixando crescer em liberdade de sermos, não só nós, mas todos aqueles que de uma forma ou outra fazem parte da nossa vida, nos escolheram ou por nós foram escolhidos.
Nos momentos mais positivos, atrevo-me a retirar determinados capítulos mais difíceis da prateleira, folheando cuidadosa e demoradamente cada página, tentando entender algo de novo que no calor da situação e na cegueira da emoção tenha deixado escapar. Estes capítulos são apenas para ser remexidos quando sentimos dentro de nós a força e coragem suficientes e saberemos que as feridas, se as houver, estarão saradas no dia em que as lágrimas deixarem de rolar a cada leitura, ou isso, ou então secámos definitivamente e perdemos a capacidade de sofrer. Tenho medo! Mais ainda de perder a capacidade de amar…
(...)
Chopin - Tristesse
(...)
Era Verão, participava de uma fuga lenta a um amor que não lhe estava destinado, quase que estava já convencida de que tinha virado a página, já não perdia a respiração quando o via, já não tremia quando lhe falava e tudo estava dentro dela mais pacífico desde que a sua determinação, que ainda hoje não sabe bem onde a foi buscar, a fez ter a coragem de assumir de que estava na hora de encerrar aquele capítulo. Um capítulo escrito de rosas vermelhas, símbolo do amor, e dos espinhos dessas mesmas rosas, inundado de lágrimas salgadas e de melodias que lhe conferem, ao capítulo, um especial “quê” no livro da Vida.
Já sorria, os dias já não se arrastavam, o Sol já brilhava de novo dentro de si, e ali estava ela perante nova folha de papel em branco, sentia que de novo o Amor a podia conquistar, estava disponível para que isso pudesse acontecer, sentiu-se de novo tremer, sentiu de novo que a respiração lhe falhava e que o chão não estava mais no lugar. Porém, cedo se revelou de que afinal, a folha não estava em branco… como que de repente surgiram páginas e páginas seguidas de uma história que já havia sido escrita. Surgiram do nada sem que ela pudesse fazê-las parar. Queria deter a crueldade daquelas palavras, queria apagar o sentido daquela história, mas estava escrita a tinta permanente, e ela sabia de que nada adiantava arrancar as folhas, pois também permanentemente ficaria inscrita no livro da sua vida. Por momentos, longos momentos, perdeu a noção de si, quem era afinal, de que era feita, o que a movia!?
Porquê!?
Tomou então as rédeas da escrita, e no meio da folha vazia, cheia de branco, macia, cheirando ainda a virgem, derramou a palavra que a seguir se dita:
FIM!
Mas ela não acredita, vive na Esperança já quase vazia de que um dia, na sua vida, aparecerá de novo uma folha em branco para ser preenchida…
Mas ela não acredita, vive na Esperança já quase vazia de que um dia, na sua vida, aparecerá de novo uma folha em branco para ser preenchida…
Escrito para: Fábrica de Histórias
[2011/01/03]
4 de fevereiro de 2011 às 12:54 �
Gostei tanto da tua página em branco..
As tuas palavras têm voz e transportam-nos para um lugar sereno.. nas tuas histórias há sentidos que são tão meus, também..
Escreves com alma (já te disse?) e isso, quanto a mim, é mais que tudo..
Quem tem amor às letras, como nós, e escreve com sentimentos grandiosos, não deve deixar de nos proporcionar momentos de leitura como este.. Aagradeço-te por isso..
Um beijinho
4 de fevereiro de 2011 às 18:38 �
Olá Leonor!
Agora deixaste-me sem jeito :) Muito obrigada, sou eu quem de facto tem a agradecer! Confesso, depois de publicar a minha página em branco, fui espreitar, li a tua e pensei: "Meu Deus, isto sim é escrever!" Faço das tuas palavras nesta tatuagem, as minhas palavras sobre ti e a tua página em branco, que de facto me deixou sem palavras na altura, mas lá voltarei a passar para novamente ter o prazer de te ler e deixar também lá uma tatuagem minha.
Obrigada, mais uma vez, e um beijinho
5 de fevereiro de 2011 às 13:20 �
;)... e como as duas já disseram as palavras que eu poderia dedicar a ambas, nada fica para mim além de dar os parabéns às duas pelos momentos de prazer que me proporcionaram. Já estou à espera dos próximos capítulos...
BEIJO
5 de fevereiro de 2011 às 13:27 �
" ...dar os parabéns às duas E AGRADECER pelos momentos de prazer..." assim é que está certo. :P
:*
6 de fevereiro de 2011 às 17:44 �
Como um rio de águas límpidas, escorreitas, correndo livremente, assim a permanência/impermanência desta tinta escorrendo por cada folha em branco.
Gostei muito amiga P. Continua. Votos para que esse rio ultrapasse todos os escolhos e continue correndo assim, para nosso deleite.
Um beijo.
Gina
6 de fevereiro de 2011 às 17:49 �
Para nosso deleite e para que chegue a ser Oceano, sem receio de se perder, mas com a vontade de atingir a plenitude.
Abraço.Gina
6 de fevereiro de 2011 às 19:45 �
Fernando :) xi <3
Obrigada, a Fábrica de histórias é um bom incentivo à escrita, e lá descobri pessoas que realmente escrevem muito bem e com as quais me identifico.
Obrigada pela passagem :)
Beijinhosssss
6 de fevereiro de 2011 às 19:46 �
Gina :) xi <3
Obrigada maniga!! Gosto muito de vê-la por aqui, onde o rio corre calmo ou bravo mas sempre intenso... um dia, o Oceano... acredito ;)
Beijossssssss
7 de fevereiro de 2011 às 20:54 �
Esta página em branco está de facto maravilhosa... subscrevo a minha irmã Ametista de quem sou fã incondicional. A tua escrita e a dela têm algo em comum...
Beijinhos
7 de fevereiro de 2011 às 22:14 �
Ónix,
A Ametista já tem duas fãs incondicionais, então :)
Comparares a minha escrita com a dela... é de facto um grande elogio pelo qual te agradeço de coração.
Também gostei muito do teu virar de página :)
Um beijinho
8 de fevereiro de 2011 às 22:38 �
As tuas palavras mesmo em prosa são poesia:))) E as tuas histórias também são poesia:))E se te conhecesse de certeza que iria achar que tu também és poesia:))
Um beijinho grande
Cláudia (magnolia)
9 de fevereiro de 2011 às 00:31 �
Bem... e que dizer agora perante a tua tatuagem, Cláudia!? Que me ficou no coração? Com toda a certeza!
Muito Obrigada!
Um beijo grande