23:13
Neh Nah Nah Nah - Vaya con dios
Se há coisas de que eu gosto nesta vida uma delas é, sem dúvida, viajar. Viajar é, ao mesmo tempo, uma imensidão de aprendizagens, uma aculturação constante e um divertimento sem comparação. Não gosto de viajar sozinha, mas por circunstâncias da vida, as últimas viagens que fiz fui acompanhada apenas por mim própria e por todos os "Eus" que cabem dentro de mim.
Na minha última viagem a Paris vivi uma situação inusitada. Hoje quando penso nela ainda sorrio.
Conheci Jaques num bar na Boulevard Saint German, onde trabalhava como entertainer fazendo stand-up-comedy em versão francesa, o que só por si parece ser algo muito estranho. O meu parco francês era suficiente para ir percebendo as piadolas que ia debitando para gáudio de quem o ouvia. Não podia negar, Jaques tinha bastante piada naquilo que fazia. Durante um dos intervalos da actuação e ao ver-me no bar sozinha, aproximou-se sorrindo, confesso que tinha um ar cómico e muito pouco credível, e perguntou-me se eu dançava. Bom, eu entrei no espírito da coisa e lá lhe respondi no meu francês fraquinho fraquinho que dançar eu até dançava, se houvesse música. Abanou a cabeça e estendeu-me a mão dizendo que não era necessária música e ainda não sei bem onde estava com a cabeça ou se era a sangria a falar sozinha, lá lhe entreguei a minha mão e começámos a dançar uma música que simplesmente não tocava. Nada mais dissemos e quando chegou a hora de voltar ao palco, Jaques devolveu-me ao lugar por preencher no bar e lá foi, piscando-me o olho.
Aquele episódio foi ao mesmo tempo estranho e especial. Fui para o Hotel naquela noite com o Jaques no pensamento. Dormi o sono dos justos e despreocupados e no dia seguinte tinha planeado ir à Place du Tertre. Tinham-me falado imenso desta Praça lá no topo pertinho do Sacré Coeur, em Montmartre. Ali se juntam os artistas para pintar e exibir as suas obras, aproveitando-se do facto de ser ponto turístico para inflacionarem o valor das obras.
Vesti o meu melhor espírito de turista e resolvi que subiria Montmartre a pé desde o Moulin Rouge. A meio do caminho tive de parar para tentar perceber se estava a ver bem, seria mesmo Jaques? Chamei-o, mas ele pareceu não ouvir. Voltei a tentar, desta vez ao mesmo tempo que lhe tocava no ombro. Ele virou-se e olhou-me como se nunca me tivesse visto. Sorri, mas a expressão dele manteve-se inalterável. Primeiro achei que ele estava a brincar, mas depois percebi que não, de facto o Jaques não me estava a reconhecer e pareceu até estar a ficar já meio zangado e aborrecido com a minha abordagem, mesmo depois de eu lhe ter explicado entre gestos e palavras que era a pessoa com quem ele tinha dançado no Bar da Boulevard Saint German. Frio, o olhar daquele homem era completamente frio. Resolvi desistir e continuar o meu percurso, mas já sem a animação de antes. Percorri a Place du Tertre e misturei-me com os artistas, fazendo perguntas e dando o meu parecer, do mais puro sentir que me suscitavam as telas. Depois da volta completa dirigi-me ao Sacré Coeur. Cá em baixo onde começa a escadaria via-se um personagem envolto em arranjos florais imensos e eu nem queria acreditar: Jaques.
Por momentos achei que estaria a ficar maluca, e que a sangria do dia anterior me tivesse deixado meio alucinada. Discuti comigo própria se havia de me dirigir ao terceiro Jaques que encontrava em dois dias mas acabei por decidir visitar primeiro a Basílica, quem sabe me iluminasse aquele contacto com o divino. Ainda voltei a espreitar aquela espécie de mendigo mas segui o meu caminho. Estava decidido, à noite voltaria ao bar e tiraria todas as minhas dúvidas.
Assim foi, saí do Hotel e enfiei-me no Metro. Não gostava sinceramente de andar de Metro, mas era a melhor forma de chegar ao bar. Ainda era cedo e estava muito pouca gente. Também não via Jaques em lado algum. Perguntei ao empregado do bar se haveria stand-up naquela noite ao que ele me respondeu que sim. Sorri e pedi um daiquiri. o bar ia-se compondo e Jaques surge então em palco.Tinha uma aura sobre si e todo ele era energia pura e gargalhadas sem fim. Naquela noite, mais que na anterior, estava cheio de piada, humor inteligente que encantava o público. Fiquei à espera sem qualquer certeza comigo, mas cheia de esperança de desvendar aquele mistério. Como que ouvindo o meu apelo interior, Jaques veio no intervalo ter comigo e fez a mesma pergunta do dia anterior.
- Dança? Mas desta vez a resposta foi outra:
- Dançar eu danço, mesmo sem música, mas antes disso explica-me. Ele olhou-me, intrigado e perguntou:
- Explico-te? O quê? Porque quero dançar contigo?
- Não, porque fingiste não me conhecer em Montmartre e como chegaste tão rápido à escadaria do Sacré Coeur? - Naquele momento Jaques olhava para mim como se eu viesse do espaço, mostrando uma expressão muito engraçada de tão estranha.
- Mas que dizes, não estive nesse sítios, não hoje! - Mas parou ali mesmo e desatou a rir à gargalhada.
- Humm, qual foi a parte da minha pergunta que teve assim tanta piada?
- Ele chorava já e disse-me: Estou a ver que te cruzaste com os meus irmãos.
- Os teus irmãos?
- Sim, gémeos - e continuava rindo.
Corei, tenho a certeza de que corei, estendi-lhe a minha mão e disse: - Porque esperas? Leva-me a dançar esta música que não toca.
Escrito para: Fábrica de Histórias
[2011/12/04]
4 de dezembro de 2011 às 23:34 �
esqueça-se lá a cultura e venha de lá o gémeo que dança sem música!! xD
5 de dezembro de 2011 às 00:55 �
Tri-gémeos, o Terror...Gostei muito =)
beijos
5 de dezembro de 2011 às 22:49 �
Sónia,
... que outras qualidades guardarão mais dois iguais a ele??? LOL
Beijo
5 de dezembro de 2011 às 22:50 �
T...
Era suposto ter alguma piada, (ok, eu sei que não teve)e não ser um terror :D
Beijossssss ;)
6 de dezembro de 2011 às 15:02 �
Gostei imenso...Terror são os trigemeos, não o teu texto =P
Desculpa, a minha má expressão
beijos
7 de dezembro de 2011 às 00:08 �
T.
Eu percebi, estava a brincar contigo :p Obrigada por gostares!
Beijosss
14 de dezembro de 2011 às 15:26 �
Adoreeeeeeeeeeei!
Onde há trigémeos por perto tudo pode acontecer :)
Beijinhos
15 de dezembro de 2011 às 12:27 �
Leonor, podes crer hehehe
Beijooo